terça-feira, 8 de março de 2011

Do seu amor

           Quando era pequena já tive um diário, acho que escrevia minhas angústias infantis, mas nada muito profundo. Sempre fui de guardar o profundo nos pensamentos e deixar com que ele se perca por aí...
          De fato, no exato momento passo por problemas de ordem familiar. Creio que como tudo na minha infância, minhas angústias atuais se centram na minha mãe. Às vezes, por volta dos 5 anos, quando ela conversava na cozinha com as amigas e eu estava 'esquecida em meu mundo' no quarto, eu me jogava da cama fazendo bastante barulho para ver se isso lhe chamava a atenção. De fato (se ela escutava) não havia retorno, então eu ia até a cozinha e dizia: "Mainha, cai da cama" e não me lembro de ainda assim ter sua atenção.
          Aos 9 anos fiz meu primeiro poema (mantive um caderno de poemas por um tempo que não sei onde foi parar). O poema era mais ou menos assim:

Eu deito na cama e fico pensando
O que é que será o meu grande sonho?
Será uma lágrima ou uma risada?
Será um pesadelo ou um conto de fadas?
Eu penso tanto que acabo dormindo
E no outro dia já é domingo
(....)
Penso em quantas crianças que estão sem comer
E eu como tanto até encher

Não lembro o resto, mas sei que mostrei a ela. Também não lembro de um retorno.
               A partir daí tive sobre os ombros uma pressão para ser bem sucedida nos estudos, como no poema em que Adélia diz "Tenho missão tão grave sobre os ombros e quero só vadiar". Acho que queria vadiar, mas havia sempre a voz de ordem dela que sucumbia meus desejos. Vivi na adolescência uma relação conturbada com ela. Comecei a perceber que estava sendo cobrada e não havia cumplicidade. Sonhava em ter uma amiga-mãe ou mãe-amiga para contar nos meus momentos de tristeza, mas tudo que fui criando foi uma cápsula protetora defensiva.
           Minha primeira tentativa amistosa foi para falar de meninos. Ao saber que eu havia beijado um (nunca esquecerei dessa cena), ganhei de presente de ano novo uma surra cinematográfica. Apanhei tanto que meu pai teve que intervir, também fiquei de castigo por cerca de num mês e proibida de quaisquer contatos com amigos.
         A partir desse fato começou a doutrina de: "Minha felicidade vai ser quando minha filha se formar, não arrumando homem". Interessante que, conversando com um amigo semana passada, ouvi: "Não existe mãe que fique triste com filho se casando e ainda você que já se formou duas vezes". De fato ele não conhece a minha...
          Ao fim da minha adolescência senti que se eu não me aproximasse da minha mãe, ela não o faria. Tentei. Passamos alguns anos tentando conviver em harmonia, mas sempre divergimos nas opiniões. Com o tempo fui percebendo que ela tinha um comportamento diferente das outras mães e comecei a escutar da minha família o que geralmente as mães das minhas colegas escutavam e não as filhas. As pessoas pediam paciência a mim, diziam que eu tinha uma mãe difícil de se conviver, que agia infantilmente.
         Na realidade isso acontecia. Observava que as brigas dela com meu pai eram sempre quando ela queria algo que ele não dava. Era impressionante como ela sempre conseguia...fazia zuada e ele de saco cheio dava para silenciá-la como a criança que sabe que chorando e berrando vai conseguir o que quer.
        Eu comecei a perceber que aquilo poderia não ser tão normal, comentei uma vez com meu pai, mas ele na lata: "Ela é geniosa, sempre foi assim". Pensei em procurar um médico, mas sem dinheiro era complicado. Um tempo depois passei no mestrado e fui morar em João Pessoa. Estava recebendo minha carta de morte e de alforria concomitantemente.
         Normalmente eu passava a semana em João Pessoa e aos fins de semana estava em Campina Grande. Voltava para a terra natal na expectativa de ser bem recebida, mas comecei a viver meu inferno particular. Com minha saída de casa as coisas pioraram e ela fazia de tudo para chamar mais atenção, implicava com meu pai, falava mal dos vizinhos e familiares, de mim. Eu sempre voltava para João Pessoa com uma carga negativa pesada que ela implantava a ferroadas na minha cabeça.
        A família começou a achar que minha ida tinha sido o motivo de seus surtos. Então decidi voltar para casa. As coisas só pioraram. Perdi a paciência que trabalhei para adquiri-la. Meu pai me fala em pedir separação por não suportar mais o ambiente que se instaurou na nossa casa. Sugeri novamente um médico e agora todos acreditam que ela precisa, mas ela não aceita.
          Por hora, está com raiva de mim, já tentou colocar minha avó e outras pessoas contra mim sem sucesso. Eu perdi esperanças de (re)construção de um afeto perdido pela primeira infância, estou saindo de casa mais por necessidade que por desejo, pensando em, quem-sabe-um-dia, poder voltar com a força da menininha que caia da cama porque clamava o amor da mãe.

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